Ciência cidadã: uma discussão conceitual a partir da vivência com a comunidade indígena Bororo
DOI:
https://doi.org/10.5195/biblios.2023.1124Palavras-chave:
Ciência aberta, Ciência Cidadã, Povos indígenas, Produção partilhada do conhecimentoResumo
Objetivo. Discutir o conceito e os alicerces que a ciência cidadã demanda observados na relação de produção partilhada do conhecimento entre academia e a comunidade indígena Bororo, de autodenominação Boe, localizada em Meruri no município de General Carneiro no Estado de Mato Grosso, Brasil.
Método. Este é um modo de pesquisa que não há modelos únicos e usos normativos pois o método foi construído na imersão em campo. Compreendemos a comunidade Bororo como sujeitos da partilha. Foi realizada a inserção em campo para vivenciar a cultura, envolvê-los na pesquisa e a partir da relação estabelecida, descobrir pistas dos alicerces e conceitos que dão base para o que chamamos de ciência cidadã. Buscamos na pesquisa vivenciar a cultura por meio de diálogos em três percursos: a) Acolhimento da comunidade - estabelecimento de confiança e compreensão da cultura entre ambos; b) Partilha de saberes in loco a partir dos objetivos - apresentação da pesquisa e discussões com os indígenas sobre a viabilidade e a importância de inseri-los nas discussões; c) Avaliação dos dados - retorno das análises que os dados geraram e avaliação pelos indígenas do que foi produzido pela pesquisadora. Estas etapas foram os alicerces da pesquisa durante quatorze meses entre os anos de 2021 e 2023. Durante estas etapas realizamos longas conversas individuais com quatorze indígenas. Chamamos estas conversas de testemunho, uma narrativa ampla que considera uma pessoa como portadora da dimensão da sua coletividade.
Resultados. Os dados permitiram perceber alguns alicerces fundamentais para o que chamamos de Ciência Cidadã. Dentre esses alicerces percebemos que há um convite para a vivência. Este convite dos indígenas é como uma estratégia para fazer ver que a produção do conhecimento pode ser orientada por outros valores que superam as dicotomias e hierarquizações típicas da Ciência Moderna e, nem por isso, se torna menos válida ou verdadeira, mas que tem sua importância local. Neste sentido, apresentamos a vivência como base para a Ciência Cidadã composta dos seguintes alicerces: Ética do encontro; Modo de existir entre identidade e cotidiano; Prática ativista e política; Tempo da vivência; Governança coletiva e retorno dos dados.
Conclusão. Na Ciência Cidadã, a cidadania estabelece uma ação coletiva em prol do bem comum. Manifesta-se então no reconhecimento de si e do outro para que haja justiça cognitiva e exercício pleno da cidadania no terreno científico, que para os Boe é ter autonomia para falar de si sem a tutela de ninguém. Ser cidadão é ser sujeito e não objeto de pesquisa, é produzir e ter seus dados reconhecidos no debate e nas grandes estratégias de desenvolvimento da sociedade — no campo econômico, no tecnológico, no político ou no social.
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